sábado, 3 de março de 2018

Corrupção - um mal endémico




Razão tinha o cínico e sempre atual Maquiavel nos sábios conselhos que dava aos monarcas para a manutenção do poder. É verdade que o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente.

Felizmente que hoje já não há muitos poderes absolutos que permitam corrupções totais e, sendo assim, consegue-se ir vendo muitos gatos escondidos com o rabo de fora.

São relações de poder as que as pessoas experimentam todos os dias nos empregos, nas relações sociais e até nas amorosas. Tem sempre mais poder quem, por deter, ainda que no momento, qualquer coisa que é importante para o outro, é o dominante na relação. E para além de obviamente haver sempre a possibilidade da perda do cargo que se detém, a doença, a velhice ou a morte são limites absolutos a qualquer poder personalizado. Há também a circunstância trágica de quem detém com volúpia um dado poder conviver dia a dia com o medo: o imenso e aflito medo da perda.

Não há dia em Portugal em que os cabeçalhos dos jornais não noticiem figuras públicas eventualmente envolvidas em casos de corrupção. À parte a Itália - que tem como "desculpa" o ex-libris da milenar máfia -, o nosso país aparece sempre na linha da frente dos países da União Europeia com maior índice de corrupção.

A corrupção, quer na forma ativa, quer na forma passiva, é uma doença crónica, hereditária e degenerativa, sem cura conhecida. E a única coisa que podemos fazer - aqueles que, por ora, ainda não se deixaram corromper - é combater sem tréguas o fenómeno, não hesitando em denunciar todos os casos que tenhamos conhecimento.

Mas o pior de tudo é a acomodação. A atitude (quase) inevitável para quem assiste diariamente às denuncias e sabe de antemão que a culpa vai morrer solteira. Os ilustres acusados são, regra geral, demasiado chiques para conhecerem o meio prisional, têm demasiado poder e dinheiro para contratar a melhor defesa e usam de expedientes dilatórios que a própria lei lhes faculta.

Podemos, a contrario, seguir a via brasileira, parodiando os casos de corrupção nacionais; e, inclusive, acharmos-lhes graça, como parte integrante da nossa cultura, usos e costumes. Uma espécie de folia nacional, como fora um Carnaval que durasse todo o ano.

Leiria 2007*

* O panorama, dez anos volvidos desde que escrevi este texto, não mudou, antes pelo contrário, encontra-se atualissímo e em altas.