domingo, 20 de novembro de 2011

Um hiato nas palavras

Fecho os olhos, deitado sobre a cama, e escrevo dentro da cabeça. As frases ligam-se por suspiros, uma respiração ofegante, sem pausas. Daí a pouco deixo-me adormecer de novo. Nos confins da casa, fica a cozinha. Oiço o barulho constante do motor do frigorífico e alguns ruídos difusos que chegam da rua de forma indecifrável. Quando acordo de novo, quero recordar as frases que houvera escrito na cabeça, mas tudo se esvaiu. Levanto-me, olho-me no espelho, ponho a água a correr e tomo um duche. Gosto de sentir a água quente cair-me sobre a cabeça, na pele, a escorrer-me por todo o corpo. Ao voltar para o quarto, reparo que a porta está entreaberta e, sustendo a respiração, entro. Vejo-a a dormir. A cabeça sobre a almofada, um emaranhado de cabelos loiros escondem-lhe o rosto. O corpo está enroscado num lençol púrpura debruado a ocre. Deixo-me encantar pela delicadeza das suas formas, pela profundeza serena do seu sono. Destapo-lhe o corpo devagarinho, meticulosamente, milímetro a milímetro, como quem conta os poros de um braço, procurando as palavras que se foram. E nada, não encontro nada. Tudo não passou de uma imagem, de uma fantasia. A cama continua desfeita e as formas que eu divisei mais não eram do que uma ilusão de óptica do meu amor por ela.

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