domingo, 10 de janeiro de 2021

Saudades da minha Vilar

Hoje, antes do confinamento geral e obrigatório, que ocorre às 13h00, voltei aos meus passeios de bicicleta pelo percurso do Pólis, à beira do Lis, antes de me fechar em casa, onde aliás já me encontro.
Uma vez que estava sozinho, pedi a um transeunte que por ali deambulava o favor de me fotografar, pois a imagem que eu pretendia ( o castelo ao fundo e o lago maior) seria impossível de obter por meios próprios. Recebi um não categórico e um conselho para pedir a outra pessoa. Agradeci na mesma, delicadamente e sem qualquer rancor, pois, sinal dos tempos em que vivemos, até receio temos de tocar objetos alheios. Depois, sem grande pânico, uma simpática senhora fez o favor de me fotografar.
A escolha da cor da minha atual bicicleta, vermelho vivo, não foi alheia ao facto de, há quase 53 anos atrás, por ocasião do meu aniversário, ter ganho de presente uma Vilar vermelha, com selim branco, pneus tamanho 20, toda em ferro, pesada como chumbo, mas resistente e fiável como nunca outra conheci. Felizmente, ou não, já não se fazem velocípedes assim. Eram fabricadas em Águeda, à época, a terra das bicicletas; e penso que a região ainda mantém grandes tradições na área do ciclismo, pois o maior velódromo de Portugal fica para aquelas bandas.
Com essa bicicleta, a partir dos 7 anos de idade, desde Almada, a maioria das vezes sozinho, pedalei até à Costa da Caparica, seguindo-se a Fonte da Telha, Lisboa, Cascais e Sesimbra, sem contar os inúmeros quilómetros que fazia todos os dias perto de casa.
Éramos inseparáveis até o tabaco entrar na minha vida e ter expulsado a Vilar para um canto da dispensa lá de casa, a ganhar teias de aranha. Foi mais tarde oferecida por mim ao filho da nossa empregada, que certamente lhe deu melhor uso. O tabaco, entretanto, só foi definitivamente banido da minha vida há 20 anos.
Nesta manhã fria, pedalando à beira rio, a minha mente ocupou-se destes pensamentos, enquanto ziguezagueava por entre os passantes para não atropelar ninguém; e, por fugazes momentos, revi-me naquele rapazinho franzino, que pedalava furiosamente uma Vilar vermelha pelas ruas de Almada e pelos pinhais da Charneca da Caparica, com os joelhos sempre esfolados das quedas constantes, mas com um sorriso de felicidade estampado no rosto. A felicidade, imagem de marca da inocência, habitava-me naqueles tempos.



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