sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Sismo de 1969



Eu tinha 8 anos de idade, a minha família morava na cidade de Almada e na rádio disseram que era arriscado ficar em casa. Para além de uns quadros fora do lugar e uma racha numa parede, nada de grave nos aconteceu. Eram 3 horas da madrugada e fomos para o recinto da Feira de Almada, uma porção larga de terra batida sem construções ao redor. Já lá estavam muitas dezenas de automóveis estacionados e muita gente conhecida. Os adultos ficaram conversando madrugada dentro com a multidão que entretanto se começou a formar. Lembro-me que estava frio, mas levámos mantas para nos aquecermos no banco traseiro do Fiat 850. A maioria das crianças estava de pijama e muitos adultos também. Trouxe a minha coleção de cromos e alguns livros da Enid Blyton, o resto era dispensável, caso o teto ou as paredes caíssem e tudo se perdesse.

O maior receio da população era que se tratasse de uma réplica do terramoto de 1755, com 8,7 - 9 na escala de Richter, que devastou Lisboa no século XVIII. O sul, nomeadamente o Algarve, e a região de Lisboa foram as zonas mais atingidas pelo sismo de 7,9 na escala de Richter que Portugal acolheu em 1969.

De manhã cedo, regressámos a casa e nada de especial sucedeu depois disso. Morrerão 25 pessoas no país, mas a censura abafou, como era usual, tudo o que fosse dramático e desestabilizador da ordem pública. Para a mentalidade da época, vir para a rua em pijama era considerado estar em "trajes menores" e noutras circunstâncias, não excecionais, podia dar origem a uma visita à esquadra mais próxima e aplicação de uma multa.

Na véspera eu tinha completado o meu oitavo ano de existência e ainda andava embasbacado com as prendas, mas esta foi talvez a minha primeira grande experiência de vida. Foi seguramente a minha primeira pijama party.

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