quarta-feira, 21 de junho de 2017

O menino perdido




Durante a noite, o menino levantava-se da cama. Caminhava pela casa vazia e às vezes cismava frente às janelas que pensava terem ficado abertas. Todos os dias era o mesmo. Deixava tudo aberto porque se sentia abandonado. Era uma grande casa, repleta de quartos e corredores intermináveis. Como criança que era, erguia os olhos ao céu e à noite e escutava lá fora o pranto dos campos. Escutava os grilos e as cigarras e julgava-os gambozinos. Nessa noite o menino olhou pela janela com os olhos muito abertos e tudo era uma escuridão enorme por não se saber onde terminavam aqueles frutos tão noturnos da vida. A casa também chorava com ele. Toda aquela casa envelhecia durante o tempo e por dentro o menino agastava-se com o seu próprio silêncio. Trazia em si aquele choro das magnólias e das hortênsias, vergadas sob o seu próprio peso, que já pendem para a terra. Aquele mesmo choro dos presentes nunca oferecidos, daqueles presentes para sempre esquecidos, para sempre ausentes no amor. O menino repetia para consigo mesmo: «um dia morrerei», e voltava a repetir, «tudo isto que eu vejo é transitório, todo este nada que eu sou é absolutamente transitório». E com estes ditos, inclinava-se cada vez mais para o silêncio; e no seu coração mais cansado, a morte, terna mas petulante, aconchegava-se no seu peito como se fora o tão ansiado abraço do amor.





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