terça-feira, 24 de abril de 2012

E que tal um novo 25 de Abril?


A Associação 25 de Abril, Mário Soares, Manuel Alegre e, de uma forma geral, os participantes diretos na Revolução dos Cravos, numa atitude inédita, decidiram este ano não participar nas comemorações oficiais da efeméride. Sem querer tecer considerações de ordem partidária, mas necessariamente de afirmação política, concordo em absoluto com a sua posição. Afinal, os valores que nortearam a Revolução de Abril estão hoje em dia completamente desvirtuados. Duvido, aliás, que tenha merecido a pena que tantos homens e mulheres tivessem dado o melhor de si a causas tão nobres. Gente houve que abdicou da sua felicidade pessoal em prol do bem comum, de uma sociedade mais justa e igualitária, do fim de uma guerra colonial - que só aproveitava a uns poucos e onde grande parte da nossa juventude ficou mutilada, física e psicologicamente, ou perdeu a vida -, dos valores da liberdade de expressão e criação. Foram muitos os homens e mulheres que estiveram presos, foram torturados, estigmatizados, viram os seus bens confiscados, perderam a família, o emprego, a carreira, o nome, a dignidade, a saúde, e, nalguns casos, a vida, tudo por nós. O 25 de Abril não valeu a pena - um "sol de pouca dura". Foi uma brisa passageira na modorra das desigualdades gritantes que, em poucos anos, face aos sucessivos governos que Portugal tem conhecido, à ditadura dos mercados, ao modelo societário em que cada vez mais nos afundamos e do qual aparentemente não consigamos sair, tem paulatinamente mandado às urtigas as conquistas dos trabalhadores e as liberdades com tanto sacrifício conquistadas. Cada vez que me falam em comemorar o 25 de Abril, pergunto-me: qual 25 de Abril? O que há para comemorar? Passados trinta e oito anos, que réstias sobraram das conquistas sociais? Onde está a democracia e a sociedade mais justa? O que faz todo o sentido é,  isso sim, falar-se num novo 25 de Abril, mas desta vez numa versão menos poética, menos light, capaz de alterar com caráter de permanência o estado das coisas. Quem estudou História sabe bem que os podres de um tecido social, a injustiça crónica, o poderio exploratório dos mais fortes sobre os mais fracos, só se consegue extirpar através de uma revolução. O seu surgimento numa versão mais musculada, é coisa que já não será do meu tempo, mas é impossível conceber que a nossa paciência bovina dure eternamente. Um povo não é feito de pau.

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