terça-feira, 10 de abril de 2012

Tiras de um diário


Voltou a chuva e o frio. Mas nem sempre assim é por estas alturas do ano. Hoje o dia acordou baço, monocromático, nevoento, sem graça e a chuva caía copiosamente nas calçadas. As aves que moram no bosque traseiro da minha casa devem estar escondidas, a tremelicar de frio, nos ramos mais altos da copa das árvores, pois não consegui escutar o seu useiro trinado, logo pela manhã. Coitadinhas das aves. Muitas vezes me interrogo: onde será que dormem os pássaros que não migram para paragens mais quentes durante as longas e gélidas noites de inverno? E como sobrevivem a temperaturas tão baixas? Ignorante confesso em assuntos de ornitologia, tudo o que respeita a estes seres pequeninos, que já me habituaram à sua presença durante grande parte do ano, é para mim um mistério insondável. Mas, pouco a pouco, sei, o sol irá reaparecer. A princípio, timorato, incapaz de romper por completo as nuvens espessas, mas depois em todo o seu esplendor. Tudo é ciclíco: a vida, a morte e de novo a vida; a alegria, a tristeza e de novo a alegria. A seguir à tempestade vem a bonança, mas esquecem-se sempre de dizer que a tempestade, cedo ou tarde, tornará. Há quem seja tragado pela mudança das estações. É a melancolia sazonal, o mal de viver partilhado por quem retira da repetição dos dias o conforto possível. Mas, quando a mudança das estações traz o contrário do que deveria? Quando, na passagem do verão para o outono, não vem frio, cinzento, a provisória morte da Natureza? Quando, chegado outubro, ainda é verão? E se a primavera traz chuva, geada, o regresso às roupas quentes arrecadadas pelo aquecimento global no baú do inverno? Poderá a melancolia trocar as voltas às estações? Precisará essa sombra cinza e taciturna que as estações se confirmem, mudando? Estará sempre vigiando, o determinado passo em falso do tempo?

Sem comentários:

Enviar um comentário