sábado, 6 de maio de 2017

Terapias - a alternativa




Se há algo que me conforta sempre que estou debruçado no varandim que dá para o interior de mim, são os momentos em que fecho os olhos e deixo-me invadir pela música. Os temas imemoriais de Mozart, Bach, Vivaldi, Puccini, Gershwin, Tchaikovsky, entre vários autores que tanto admiro, têm esse especial condão de transformar em leveza as máculas mais pesadas que infernizam a minha tranquilidade. A música clássica tem essa mágica: azula os negrumes que por vezes me assombram, com rasgos de felicidade que invadem e restauram a frescura e o esplendor vital que careço sentir.

O choro clamoroso dos violinos, os violoncelos, os cravos, as harpas, conseguem, ainda que por momentos, transportar-me até perto da amostragem do ideal de “mais belo” – a estética elevada à excelência – que há muito persigo como a meta daquilo que julgo ser a felicidade suprema: uma espécie de concórdia harmoniosa, de convergência universal, onde a mediocridade cede lugar à qualidade e o aperfeiçoamento é exemplo a seguir.

Esta musicoterapia, que augura boas sensações, pouco tem de inovador. Há muito que se apontam as propriedades benéficas da audição de certas músicas no espírito humano e também no comportamento animal. Basta relembrar-nos das experiências obtidas em vacarias no que respeita à qualidade e aumento do leite produzidos. A diminuição do stress faz com que as vacas produzam mais e melhor leite e já há explorações pecuárias, em certos países da União Europeia, onde é comum entrar numa vacaria ao som de uma Rapsódia de Rachmaninov ou da Ave Maria de Schubert.

Já se fala da hipoterapia, ou da capacidade dos equídeos favorecerem a cura de certas maleitas do espírito e de doenças do foro cognitivo em crianças, a par talassoterapia e da oftalmoterapia, entre tantas outras técnicas inovadoras e revolucionárias.

Mas todas têm um objetivo comum: o coadjuvarem os tratamentos conducentes ao bem-estar e à descompressão, provocados pela violência antinatural da sociedade moderna, perfeita na criação de criaturas autómatos, monstros desprovidos de criatividade ou capacidade de autodeterminação.

Nós, ou alguns de nós, onde eu me incluo, não estamos impermeabilizados contra a violência extrema que representa a obrigação de desempenhos quotidianos que pouco ou nada tenham a ver com as nossas formas naturais de expressão. E é por vezes esse choque de contrários, esse dilacerar de vontades – ato de violência reiterada que nos obriga a fazer algo completamente desajustado da nossa vocação natural - a fonte mais ignóbil dos nossos maiores padecimentos.

[Nunca fazer cedências totais às provações (incontornáveis) impostas ao EU, mas, pelo contrário, preservar intata, custe o que custar, a capacidade de expressão do «ser genuíno» - aquilo que vale!]

É esta, porventura, a condição de coerência que julgo ser necessária para a sobrevivência nesta sociedade poluta, que esmaga com regras ditosas que não escolhemos, mas que, para o bem e para o mal, é nela que habitamos e é a ela que temos de nos adaptar ou... ensandecer.

É à música, que amiúde oiço e me diviniza, como um astro luminoso grafado com a maiúscula de Sol, que devo esta homenagem: uma núbil estrela da beleza, esmaltando de oiro e calor de aconchego o fiar dos dias menos azuis, que teimam, por vezes, anuviar os momentos em que a contrariedade em mim prevalece.*



* Uma janela com vista para o mundo - Leiria- 2013

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